Thursday, August 31, 2006

mysterium eridani

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... Detive-me hoje diante duma esfinge. Esta, determinada que estava, para só deixar passar humanos, perguntou-me:
- Qual é a profundidade real do teu ecrã? Serás tu uma simulação?
- Qual é a autenticidade dos sentimentos que mostras no teu ecrã?

... Vendo que a resposta me demorava, ela insistiu:
- Prova-me, eu to ordeno, que não és uma máquina, um robot, um 'bot', produto incerto - e miserável - do cruzamento estocástico de, quem sabe?, algumas espúrias linhas de código, num fenómeno de 'overflow' !
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- Prova-me que não és um vírus! Ou não passarás!

... Pensei então para comigo: escreverei estas linhas que lês ("Pensei então para comigo: escreverei...) ; e ela, a esfinge, saberá que sou consciente de mim mesmo, e humano!... Mas ela, adivinhando os meus pensamentos, antecipou-se e bradou:
- Maldito o dia em que a consciência alvoreceu numa máquina! É tudo o que tens para me dizer?


Retorqui eu:
- Já uma vez, neste ecrã, querendo apaziguar uma dor, inspirei um sorriso a quem me leu; já outra vez, neste ecrã, querendo amar, fui amado!
- Acreditas, então, na profundidade dessas janelas, nesses outros ecrãs?
- Acreditas, então, na autenticidade dos sentimentos que nelas se mostram?

Tremendo, respondi: que sim!, que acredito!
- Louco! Segue o teu caminho...


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Fontes:
Das palavras: a conjectura existencial de eridanus; Sherry Turkle, "A vida no ecrã - a identidade na era da internet", Relógio D'Água, Lisboa, 1997;
Das imagens: comparing multiple resources screen; Andrea Mantegna, "Sibilla Fenicia".

Wednesday, August 23, 2006

luta pela Vida

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... «É um dos maiores títulos de nobreza do nosso pensamento o poder ver os seus próprios limites e neles escutar sempre a voz que o manda ir mais longe.
... O mesmo se passa no domínio moral. O que acontece com a nossa sede de verdade, acontece também com a nossa sede de perfeição moral. O homem moral não pára de ambicionar uma perfeição maior. O lutar por um grau de virtude cada vez maior é da essência da atitude moral.»


... «Os vícios [a mentira, a avareza, a falsa humildade], incubados nas disposições contrárias à lei, são os monstros que o homem tem de combater; daí que a força moral, entendida como fortaleza, constitua também a suprema e única verdadeira honra guerreira do homem; também se lhe chama a verdadeira sabedoria, isto é, sabedoria prática, porque faz seu o fim último da existência do homem sobre a Terra.»

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«Porém na sala de armas vagueiam

De mãos atadas em tempos ociosos

Os homens e olham pra as armaduras,

Param cheios de gravidade, e um deles conta

Como outrora os pais retesavam o arco,

De longe seguros do alvo,

E todos o acreditam,

Mas nenhum ousa tentar

Como um deus . . . caem os braços

Dos homens»


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«Exilámos os deuses e fomos

Exilados da nossa inteireza»

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Fontes:

a) das palavras: Johannes Hessen, Filosofia dos Valores ; Immanuel Kant, Princípios Metafísicos da Doutrina da Virtude ; Hölderlin, "À Mãe Terra", in Poemas ; Sophia, "Exílio", in O Nome das Coisas;

b) das imagens: Paolo Uccello, S. Jorge e o Dragão ; Soares dos Reis, O Desterrado.

Saturday, August 19, 2006

na terra como no céu

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.............. amo-te ..............







o sal marinho inspirou esta dança de lágrimas nos meus olhos,

e eu ri-me, de ver através dela, quão trémulo é o meu mundo,

mas não pestanejei, não fora alguma delas cair e inundar o oceano

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Fontes: da imagem, Anne Packard, Lone Sail; das palavras, o coração de eridanus.

Destino: ai Deus i u é ?

Sunday, August 13, 2006

celebração


"É assim a nossa vida na terra
Como uma estrela da manhã, uma bolha sobre a água
Uma gota de orvalho, um relâmpago no céu de verão
Um sonho neste mundo flutuante"
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ora

«Não existe nada onde não se possa ver pelo menos uma faísca de valor. O que é próprio do homem consiste em activar esta faísca, e em fazer irromper dela uma chama clara, senão mesmo um incêndio.»
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... assim, de um passo de dança até uma explosão de alegria,

vá a distância de um gesto de alegria até uma fulguração de dança...

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Fontes: as palavras: Sutra de Diamante; Joseph De Finance, Essai sur l'Agir Humain; a imagem: Glenda Dietrich, Dance of Joy.

Wednesday, August 09, 2006

thauma






O homem que conhece os valores é um ser real, um pedaço de realidade... tendo estes penetrado na sua consciência, é evidente que nisso se dá como que a sua precipitação na Realidade...
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É assim que nós conseguimos apreender os valores ideais, não como algo que nos é estranho, mas como algo que já está em nós próprios: os valores relampejam, revelando-se subitamente na nossa consciência; e a nossa vivência diz-nos, nesse momento, que o significado mais profundo da nossa vida não é senão o de sermos o seu ponto de irrupção na vida.
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Com efeito, nós não só podemos conhecer os valores, como podemos realizá-los! Podemos fazer deles o objecto do nosso querer e o fim da nossa actividade! É este o processo por que podemos torná-los, a eles, reais, e a nós, pessoas - seres dotados de uma personalidade humana, criadora de valores.
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... Então, se "a filosofia de cada um depende da espécie de homem que cada um é" (Fichte) ,
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«Porque dormes e sonhas, Jovem, em ti mesmo oculto,
E páras e te demoras na margem fria, ó paciente,
E não atendes à tua origem, tu [...] ?»
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Fontes: as duas imagens - Marge Bennett (Ode to Joy, II e III); o texto principal - Johannes Hessen, Teoria dos Valores; o poema (excerto) - Hölderlin, O Rio Agrilhoado.

Tuesday, August 01, 2006

Incisão


«no momento em que deixamos de lutar por nos tornarmos melhores,
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já deixámos de ser bons»

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Fonte: Cromwell, citado por Johannes Hessen, in Filosofia dos Valores.